Direito das Sociedades Comerciais - Órgãos de Fiscalização

 

Direito das Sociedades Comerciais

Órgãos de Fiscalização

Competência dos órgãos de fiscalização

No que respeita aos órgãos de fiscalização em geral, refere-nos, desde logo o artigo 420º, nº 1 e 2 do CSC (competência do fiscal único ou do conselho fiscal)  é fastidiosamente repetido ao longo das alíneas do artigo 423º-F (comissão de auditoria) e em quinze das dezasseis alíneas do art. 441º (conselho geral e de supervisão). Além destes catálogos extensos, o Código revela outros artigos que atribuem competências aos órgãos de fiscalização, convergentes entre eles.

Fiscalização da administração da sociedade
Observância da lei e dos estatutos
Contabilística
Receção e tratamento de denúncias
Dos sistemas de gestão de riscos e controlos internos
Arts. 420º, 1, l), 423-F, p), 441º, 1 p) instrumental

Fiscalização da administração da sociedade
Quadro legal – arts. 420º, 1, a), 423º-F, 1, a) 441º, 1 d).

Controlo ou fiscalização do órgão de administração, além da legalidade formal, é também o controlo do cumprimento das regras, procedimentos de gestão criteriosa e ordenada bem como o controlo da adequação da organização empresarial e da eficiência económica da sociedade.

Fiscalização da observância da lei e dos estatutos
Quadro legal – 420º, b); 423-F, 1, b), 441º, e)).

Além da lei societária, cumpre promover a observância da lei laboral, fiscal, contratual, da concorrência, ambiental, etc. O controlo do cumprimento da legislação efetiva-se de modo preventivo e reativo, sendo ao fiscalizador alertar os administradores e/ou sócios bem como arguir judicialmente a invalidade de deliberações dos sócios ou do órgão de administração (art. 57º, 59º, 1; 412º, 1; 433º, 1).

Fiscalização contabilística
Quadro legal – 420, 1, c) a f), 2ª parte al. g), e 2, a) a d); 423º, 1, c) a f), 2ª parte al. g), als. l) a o); art. 441, 1, f) a h) e l) a o).

Receção e tratamento de denúncias
Quadro legal – 420º, 1, j), 423º-F, 1, j), 441, 1, j)

Compete ao órgão de fiscalização “receber as comunicações e irregularidades apresentadas por:
Acionistas;
Colaboradores da sociedade;
Outros.

Fiscalização dos sistemas de gestão de riscos e de controlos internos
Quadro legal – 420º, 1, i), 423º-F, 1, i); 441º, 1, i).

É ao órgão de fiscalização que compete verificar se a conceção e o funcionamento da estrutura de gestão de riscos (operacionais, mercado, financeiros, de tecnologias de informação, reputacionais, o compliance ou o cumprimento das regras legais, e nomeadamente as de solvência), dispõem de aptidão para identificar e avaliar com eficácia os riscos, protegendo a sociedade em face dos mesmos.

Importa ainda referir “outras competências”, como é o caso da contratação de peritos (art. 420º, 1, l); 423º-F, 1, p); 441º, 1, p), consiste na manifestação de poder de matriz instrumental para o exercício da fiscalização, do que a fiscalização propriamente dita; 
A elaboração anual de um relatório que versa sobre a ação fiscalizadora consiste mais num dever do que competência-poder. O poder de convocar a assembleia geral está, portanto, regulado incisivamente no art. 377º, 1 .

O artigo 441º atribui ao conselho geral e de supervisão, de acordo com as suas als. a) e b): designar e destituir os membros do conselho de administração executivo e o respectivo presidente ¬– atenção à alteração da reforma do CSC em 2006 – salvo se aquela competência não estiver prevista nos estatutos para a assembleia geral; de acordo com a al. c), cabe ainda representar a sociedade nos relacionamentos dos próprios administradores, por sua vez, de acordo com a al. r) é quem concede ou recusa o consentimento para a transmissão de ações .
Importante é referir o disposto no art. 442º: a lei e os estatutos podem estabelecer que o conselho geral e de supervisão para a prática de determinadas categorias de atos (1).

Nota pertinente é a retirada de poderes, por ocasião da reforma de 2006 ao conselho geral e de supervisão:
- não mais pode deliberar que o órgão de administração deve obter prévio consentimento para aprática de certas categorias de atos.
- já não aprova o relatório de gestão e as contas anuais (art. 376º, 1, a); 453º, 1) e os estatutos sociais podem determinar que a remuneração dos administradores seja fixada pela assembleia geral (ou por comissão por ela nomeada), afastando assim, o conselho geral e de supervisão (ou sua comissão) – art. 429º

O CSC, oferece, do modo acima abordado três sistemas orgânicos, com a reforma, é titular de larga convergência funcional entre o órgãos.
Observe-se, com efeito, o sistema monístico estabelece ligação entre o managerial model e o monitoring model; por seu turno, no sistema dualístico verifica-se uma tendência de o órgão de fiscalização aceder mais facilmente às informações da sociedade e maior cooperação com a administração na tomada de decisões de gestão. Em Portugal, o novo sistema monístico consagra a referida conexão e o sistema tradicional propicia o exercício de funções fiscalizadoras (também) no seio do órgão de administração (com especial relevo para a existência de administradores delegados ou comissão executiva), é também no sistema dualístico que se verifica que, o conselho geral e de supervisão ficou, depois da reforma de 2006, com reduzidas capacidades de cooperação no que respeita à gestão societária.

Quanto ao ROC (singular ou em regime de sociedade), compete, na veste de fiscal único exercer as funções de fiscalização estabelecidas no art. 420º, 1; quando seja membro (necessário) do conselho fiscal, pode ainda ter de colaborar nas tarefas indicadas no n º 2 do mesmo artigo. Compete ao ROC (fiscal único ou membro do conselho fiscal) realizar a revisão e certificação legais das contas: art. 446º, 1 e 3 .

Poderes dos órgãos e seus titulares

A lei confere aos órgãos de fiscalização, e por conseguinte, aos doutos titulares os poderes essenciais para levarem a cabo as atribuições ou competências acima referidas.
O CSC preceitua alguns desses poderes, com especial relevo para o art. 421º: os titulares de órgão de fiscalização das sociedades com estrutura tradicional podem exigir ao órgão de administração (ou aos administradores), os documentos pertinentes para a atividade de verificação e de inspeção, assim como as informações relativas à vida da sociedade (als. a) e b), nº1); têm também o poder de obter certas informações de terceiros; têm também o direito (e dever: 422, 1, a) de assistir às reuniões do conselho de administração (al. d), nº 1) .

Referência ao silêncio do CSC de poderes da comissão de auditoria, visto que é composta pelos mesmos administradores.

As funções de gestão corrente são executivas – art. 407º, 3 tendo limites preceituados no nº 4 – interpretação extensiva compete fazer: são de gestão corrente além do art. 406º o 407º, 4, als. e) e g) a j).

Delimitando positivamente, as que colocam em prática a “alta direção”.
O Conselho geral e de supervisão tem o dever de comunicação ao conselho de administração ou ao seu presidente informações relevantes (423º). O conselho de administração tem o poder de exigir o cumprimento desse dever por parte do conselho de fiscalização. 
O presidente do conselho geral e de supervisão pode exigir informações que lhe sejam solicitadas por outro membro fiscalizador, as informações devem ser prestadas deste modo, a todos os membros do conselho.

O ROC-órgão, nos termos do art. 446º também é silencioso em matéria de poderes. Não obstante ex vi as funções de fiscalização contabilística previstas no art. 420º que remete para o 446º, 3, e procede ao “exame das contas da sociedade”, ou seja, a auditoria ou revisão contabilísticas e, por conseguinte, a certificação legal (EOROC, arts. 41º).

No EOROC atribui os poderes essenciais para a prossecução da consulta e inspeção da sociedade na sua esfera contabilística.

Deveres
Quadro-legal – 64º, 2

Em face da competência dos órgãos de fiscalização, bem como os poderes dos seus titulares, os deveres gerais de cuidado e de lealdade. 
A natureza dos dois tipos de órgãos são diferentes. Os concretizados avanços no que respeita aos deveres de cuidado e da lealdade dos administradores não se convergem per se para os deveres dos fiscalizadores.

O dever geral de cuidado: os titulares dos órgãos de fiscalização hão de aplicar nas atividades de fiscalização ou controlo societário diacrónica e espacial inerente à natureza funcional.
- evolução económico-financeira
- desempenho da administração
- cumprimento das regras
- adoção de decisões para o interesse da sociedade (social)

Toda a atividade de fiscalização deve ser em linha com elevados padrões de diligência profissional (art. 64º, 2).
A exigência superior à do bom pai de família 
Deveres de lealdade, tem matriz negativa (non facere), com tónica superior à lealdade dos administradores.
Dever de guardar segredo é inerente aos fiscalizadores em virtude das funções que desempenham e pelas informações, sem se apartarem de participar ao MP de factos que constituam crimes públicos .
Outra forma de lealdade é a de não fazerem proveito das oportunidades de negócio próprio ou de terceiros.

Art. 64º, 2
Deveres legais específicos
Deveres relativos à fiscalização e não deveres de fiscalização.

O fiscal único, o ROC ou os membros do conselho fiscal devem:
Dar conhecimento das verificações, fiscalizações e diligências
Informar em assembleia as irregularidades e inexatidões

Dever específico das sociedades anónimas e mutatis mutandis nas sociedades por quotas: o dever de alerta (420º-A e 262º-A) – no sentido “de prevenção” e vigilância.




Links relacionados com as competências, poderes e deveres dos órgãos de fiscalização:



Abreu, Jorge Manuel Coutinho de, Curso de Direito Comercia, Das Sociedades, Vol. II, 7ª Ed. Almedina, 2022
45.pdf (occ.pt)
henriquetadjalo,+Journal+manager,+Art.12.pdf
MODELOS DE ADMINISTRAÇÃO E FISCALIZAÇÃO DAS SOCIEDADES ANÓNIMAS E RESPONSABILIDADE DE ADMINISTRADORES E FISCALIZADORES EM RELAÇÃO À SOCIEDADE (ul.pt)
Ordem dos Advogados - Doutrina - João Calvão da Silva - Responsabilidade civil dos administradores não executivos, da Comissão de Auditoria e do Conselho Geral e de Supervisão (oa.pt)
Sociedades anónimas – órgão de fiscalização - Apcmc

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